quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Daí me lembrei

Li no tuírer da Deeercy (Gonçalves): "To com tanto azar que ganhei um galho de arruda e ele desviou o meu salário pra comprar panetone".

Daí me lembrei como esquecemos fácil.

Daí me lembrei também de um negócio que escrevi a pedido de Liana F. e Guigas Gibson para um jornal sobre política que seria impresso em papel higiênico (é sério).

Talvez sirva (pra lembrar).

(Doce) raiva produtiva

Passava das duas da manhã quando o ator Murilo Grossi passou correndo esbaforido ao nosso lado. Era o apresentador de um dos palcos musicais no primeiro dia da programação alternativa do aniversário de Brasília, na área externa do espaço Funarte. Ainda recuperava o fôlego – um cigarro meio velho pendurado na mão direita – quando, eufórico, começou a discursar sobre as qualidades de Brasília e do seu povo, a despeito da sujeira política (local e nacional), nossa vizinha de sempre. O público respondia ensandecido enquanto ele dizia algo como: “nós não precisamos desses bandidos! Arruda... Paulo Octávio... E o pior deles... Joaquim Roriz! Brasília é maior do que isso!”. E arrematou, extasiado: “Vamo matar eles!” (sic). Gritamos e rimos, quase agradecidos, tentando encobrir a vontade (passageira) de concretizar aquela ideia. Fora o nítido exagero, a explosão do ator traduz bem o sentimento do brasiliense naquela noite em que, apesar da idade, nos tornamos cinquentenários.

Raiva. ‘Ódio puro concentrado’, como no filme.

Penamos. Foi necessário ver nosso dinheiro enfiado em envelopes pardos, meias, cuecas e bolsas de senhoras do cabelo duro na tevê para que nos convencêssemos. O ex-governador e seus aliados (e aqui existe sempre um risco inadvertido de apontar o dedo a um pai, mãe ou irmão com ‘contatos’ no governo) conseguiram nos elevar a um estado sublime de subversão. Os velhos silêncios, a velha descrença de mudança e as velhas velhas de cabelo de capacete se foram. Pelo menos por enquanto.

Ocupemos. As ruas, a câmara legislativa, as reitorias, os jornais, os papéis-higiênicos, os correios eletrônicos dos que são contra o Ficha Limpa, a consciência dos políticos, os sonhos do ex-governador que dorme numa cama de solteiro na Polícia Federal.

A raiva (pacífica, construtiva, coletiva) nos fortalece, liberta, engrandece. Faz crescer nosso sentimento de cidadania e os muros das cadeias a quem realmente merece. Amassa as roupas cínicas da bondade interessada.

Faz crescer os narizes e barbas da corrupção que, abatida e envergonhada, volta para casa em um carro de vidros escuros.

2 comentários:

  1. Esse é muito bom. Seria bem propício para o papel higiênico da papuda.

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  2. Reproduzo aqui o texto que escrevi par aLiana F. com o mesmo propósito e que tem tudo a ver com o seu:

    Neymar na seleção, viva a alienação

    No país do futebol,
    a prioridade é a seleção,
    a Copa é o que interessa,
    que se exploda a eleição!

    E o Brasil se une,
    por seu grupo guerreiro.
    Os candidatos aproveitam a festa,
    fazem caixa-dois com seu dinheiro.

    Mas se perguntam de política,
    E Neymar diz que não sabe nada,
    todos figem indignação,
    mas é tudo de fachada!

    Se a seleção traz o caneco,
    tudo mundo está contente,
    a nação está unida,
    é Neymar pra presidente!

    Abração!

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